terça-feira, 6 de dezembro de 2011
A manhã estava radiante, o sol de fevereiro adentrava as janelas, as portas, as frestas, as vidas. E foi esse clima o necessário para que o bom filho ao lar voltasse. Parado em frente à porta ele já podia sentir o cheiro do café amargo de sua mãe, do jornal de seu pai, ainda quente da prensa. Os pelos de seu cão, o toque macio de seu gato nas manhãs, que se esfrega entre as pernas, pedindo por carinho. Todos esses detalhes vieram de súbito nas frações de segundo que seus dedos procuraram a maçaneta. E ele entrou. Foi recebido com muita alegria e emoção, deu nova vida àquela casa que finalmente conseguiu deixar entrar a alegria da manhã de verão. Disse que foi se encontrar, conhecer novas mentes, novos sentimentos, novas sensações. Passou por vários lugares diferentes: visitou tribos africanas, tomou cafés nos Boulevars de Paris, conheceu ruína de castelos na Espanha, monges budistas, sambou em Mangueira, até que finalmente sentiu saudade de si mesmo e voltou às origens. Voltou renovado, mas sentia que nada tinha acontecido, que ele retornou exatamente da mesma maneira como partiu, sem mudar um detalhe. E o mais estranho disso tudo é que essa era a sua maior felicidade.
sexta-feira, 4 de novembro de 2011
Primeiro vem a insegurança de pisar com os pés descalços na areia macia, quente e acolhedora: resultado de uma rotina de desconfianças, de olhos e ouvidos atentos à qualquer coisa que destoe com o caos nosso de cada dia; mas em poucos minutos vem a redenção, e se entrega por completo a tanta paz, tanta maciez e acolhimento. E com isso eu vou em frente, abocanho minha incerteza, mastigo e engulo com frieza e determinação. E cada passo dado é uma batalha. Cada vez que eu finco a planta do meu pé sobre a areia fofa, uma vitória foi conquistada. Até que a temperatura sob meus pés vai esfriando e minha alma vai se preparando para a o infinito a medida em que a areia vai se esfriando, escurecendo e condensando. E quando finalmente seus pés molham-se na água, ele tem certeza que jamais será o mesmo, que junto com o sal, uma parte de si condensou em seu corpo e lentamente vai indo embora, a medida em que seus passos avançam num caminho sem começo, sem meio e sem fim.
sábado, 22 de outubro de 2011
Primeiro o sol, o calor, as flores... o ânimo de uma manhã fresca de um dia qualquer. Sem pretensão nem grandes intensidades. Aí vem a chuva, que escurece, resfria, deixa tudo tão sem graça, mas também rejuvenesce... mas daí a chance de ser uma tempestade, um furacão e toda essas desgraça seria uma centelha de um legado de miséria e labutação que durará por dias consideráveis, infinitos.
Mas se não fosse deste jeito, como seria?
sábado, 10 de setembro de 2011
Trabalhar, trabalhar... cada vez mais
Manter meu corpo e mente ocupado me cai hoje como um vício, não vejo saída senão no trabalho, no estudo, tarefas domésticas, ou qualquer coisa que me dê folga de mim. Me espanto quando vejo meu reflexo, não consigo pensar na ideia de estar confinado comigo mesmo, preciso sempre manter minha alma distante, senão me desespero, me rasgo, morro de espanto e desgosto.
quinta-feira, 1 de setembro de 2011
Tem horas que escrever parece uma questão de vida ou morte. Sinto meu pescoço roçar numa corda grossa e meus pés bambos num chão que, para se manter firme e sólido precisa do alicerce das palavras tiradas do fundo da alma. Palavras essas recolhidas em meio ao desespero de um condenado. E aí meus dedos percorrem desesperadamente pela superfície mole do teclado, tentando me salvar de algum jeito. O resultado normalmente é um texto estranho, bizarro, com vida curta, que apodrece em poucas horas.
Talvez hoje eu andei, em quilômetros, metade do que eu previa pra semana inteira. Fui entregar minha documentação na escola em que eu darei aula (em breve o rafinha aqui vai também atender como Teacher Rafa, que orgulho!). Desci na estação Vila Mariana e, na doce ilusão que eu chegaria em dois palitos na escola, eu desciiiiiiiii a avenida Lins de Vasconcelos até não poder mais. Depois de um quilômetro eu me emploguei e, quando eu vi, passei do número. Mas eis que eu acho meu tão esperado destino, e de surpresa me vejo na frente de uma fortaleza verde (as cores da escola são vermelho e azul), com portaria, dois prédios e garagem com senha de acesso. Tão diferente do agradável ambiente das escolas... Entrei, sentei e me cheguei... mal podia eu imaginar que eu ia permanecer naquele lugar por pelo menos três horas. Depois de ter que pegar um ônibus pra abrir conta num banco, me atrapalhar todo na hora de guardar minha mochila e a bolsa da moça que foi comigo pra também abrir a conta dela, e outras gafes do tipo eu cheguei na minha casa. Liguei pra minha mãe e fui com toda a sede de uma dor de cabeça desnorteante ao pote milagroso de neosaldina. Aí que eu me desnorteei mais ainda. Em poucos minutos eu estava nocauteado de tanto sono, não conseguia articular pensamento nenhum. Não pensei duas vezes antes de tirar meu cochilo de redenção. Acordei ainda sob o efeito do analgésico, misturado a uma fome avassaladora e uma estranha sensação de deslocamento, como um estrangeiro em minha própria casa. E dessa vertigem de sensações, passei do riso ao choro e aqui me encontro ruminando essa coisa sem cor nem forma, mas com presença marcante, como um espírito que suga minha razão e consciência
quarta-feira, 31 de agosto de 2011
terça-feira, 9 de agosto de 2011
Buracos
É uma ausência. Não é de alimento, todos as minhas refeições foram feitas, aliás, eu acabei de terminar uma. Não é de afeto, me vejo cercado por pessoas queridas, que me dão e de mim recebem imenso carinho. Não é de dinheiro: posso não ter muito materialmente, mas ao mesmo tempo não tenho gastos, na condição em que me encontro o dinheiro seria algo quase que supérfluo, eu não saberia o que fazer com ele. Não é de saúde, aliás, esses dias eu me curei de uma gripe, estou ainda com aquela sensação de "como a vida é maravilhosa quando sua garganta não dói". Mas essas paredes me deprimem, essa luz me cega, todos esses livros, essas músicas, essa arte maldita, cansativa, desgastante que tanto me encanta mas agora, exatamente neste momento, me consome, me faz mal. Do que preciso? Será que realmente preciso de alguma coisa nova? Se essas perguntas tivessem mais resposta eu agora seria uma pessoa mais alegre.
quinta-feira, 28 de julho de 2011
Sobre o tédio e a morosidade
Férias pra mim é um negócio agoniante. Ficar sem foco, sem correr atrás de uma uma notinha de dinheiro pendurada numa vara de pescar presa ao meu traseiro pra mim é a morte, um castigo. Principalmente quando estou sem dinheiro pra me distrair em alguma festa, sessão de cinema, porre, ou qualquer outra ilusão que ele possa comprar.
Bem, para a felicidade do poeta e para a infelicidade da poesia em si, eu tenho a minha mão 24 horas por dia, a internet pra me animar. Ou desanimar, como cheguei à conclusão, depois de ter lido todos os artigos de artes, política, cosméticos, fofoca, (ad infinitum), ter jogado todos os jogos, visto todos os vídeos engraçados, ouvido todas as músicas e feito de tudo que minha paciência e minha vista aguentaram. Até que surgiu uma luz.
Não é que no meio do silêncio da sala eu ouço a abertura de "A Grande Família"?! E me vem a cabeça a brilhante (sem ironia) ideia de assistir. E por que não na televisão do meu irmão? Afinal, carente do jeito que seus 14 anos o obrigam a ser, isso até que faria bem pra ele. Por azar a introdução já tinha passado e, portanto, eu só pude assistir os quinze minutos finais. Mas por sorte, foram quinze minutos que mudaram meu humor esta noite.
Saí daquele quarto pensando nos dias em que apostar corrida, brincar com a cachorra, bater cards, ou fazer qualquer coisa que exigisse a presença física de uma mais uma pessoa (ou pelo menos de mais um ser vivo) era o máximo do máximo, o suprassumo da diversão. Até que veio a internet, a tv a cabo e toda a sorte de tecnologias e tornou isso obsoleto, careta, tradicional, quase que um insulto frente a tanto dinamismo, tanta modernidade, tanto prazer solitário.
Logiacamente, seria uma hipocrisia tamanha da minha parte usar essa situação inusitada pra fazer qualquer crítica sem sentido à internet, e essas modernidades todas, tanto que cá estou, ouvindo música, fuçando a vida alheia e fazendo tudo o que há meia hora estava me aporrinhando a paciência. Só me vi surpreso diante da rotina entediante que eu me encontrava mesmo com a bênção da santa internet. E espero que daqui em diante eu possa usar meu tédio como um termômetro que nivele os meus excessos e possibilite sempre uma divertida experiência saudosista.
quarta-feira, 27 de julho de 2011
A primeira vez foi uma brisa, uma sensação de leveza que com discreta maestria veio, se fez presente e foi embora. Quieta. Suave. Na segunda, a sua presença já pareceu mais concreta, mais marcante, e assim passou-se os dias, os meses. Agora que a brincadeira cansou, que já está começando a fazer mal, sua ausência de tempos em tempos grita, como uma sirene, como um alarme, como uma criança faminta longe da mãe. E o que era apenas uma inocente felicidade virou uma necessidade corrosiva, um doce com final azedo. Saboroso, porém indigesto.
sábado, 9 de julho de 2011
De repente parece que tudo fica negro. Perdido num mar de amarras e contrições, tudo pra mim me parece muito difícil: O teclado parece estar coberto de pedras pontiagudas que me impedem de escrever; minha voz parece envenenada, me impedindo de falar; minhas pernas travam e o caminho se impossibilita. Minha expressão some, minha vontade de viver morre. Pra piorar a minha situação, normalmente essas anomalias são consequências de uma adaptação tensa, de uma situação sufocante, o que duplica a já angustiante dor. Espero acordar logo desse pesadelo
quinta-feira, 21 de abril de 2011
Vejo uma maré de pessoas hipnotizadas por uma falsa alegria, uma falsa igualdade, uma falsa justiça. Ondas de pessoas que se veem oprimidas por uma realidade desumana, mas encontra anestésico na alienação, nos excessos, no desrespeito aos limites do corpo.
E qual é o meu papel diante dessa triste realidade?
quinta-feira, 27 de janeiro de 2011
Uma caneca de chá mate resfriado pelo tempo, a luz intensa da luminária de mesa, o som confuso de um cd independente qualquer ao fundo e um maço de papéis que carregam em si o mais ardente e sincero desejo de vê-los carbonizados por um fogo-fátuo utópico, inalcansável.
Assim se resume a véspera do meu happy-hour. Mergulho, assim, em vagalhões de paralelismos, paradoxos, que me fazem afundar em um profundo e escuro oceano de dúvidas.
domingo, 16 de janeiro de 2011
Oxímoros
Quero a fome avassaladora das regiões mais abandonadas do universo. Quero queimar na intensidade vermelha de mil sóis. Quero me embriagar até meu fígado apodrecer. Quero fumar todos os cigarros do mundo. Quero cheirar todas as drogas. Quero, enfim, ser o bode espiatório dos vícios mais sórdidos e dos sentimentos mais sombrios que a inteligência humana pode conceber.
Paradoxalmente, meu desejo mais íntimo é não possuir nada além do básico para uma felicidade pura e inocente.
Todo dia um ninguém José acorda já deitado. Pois é, ainda sob efeito ainda da Atensina, eu acordei 15 mintos antes do almoço, já pensando nas horas perdidas durante a manhã. Mas acordei de bom-humor, brinquei com a minha mãe sem nem ter escovados os dentes ainda.
Depois do almoço, eu chego no meu quarto e vejo meu irmão sentado na minha mesa, usando meu notebook. Uma coisa que me deixa possesso é ver alguém instalado no meu quarto, sem me dar a privacidade de usá-lo. Como se não bastasse o fato de que, desde que eu ganhei esse note ele simplesmente esqueceu de tudo mais que existe em casa, eu ainda não recuperei a privacidade do meu quarto, que pra mim é essencial. Não sei, pode parecer egoísmo da minha parte e sei bem que quando eu estiver fazendo faculdades eu não poderei gozar da regalia de ter um cômodo só meu, mas o ato de cruzar a porta do meu quarto é uma expressão de desejo de privacidade absoluta. Não suporto quando alguém senta na minha mesa, deita na minha cama, abre a porta do meu guarda-roupa como se estivesse sentando na mesa de jantar, deitando no sofá da sala de estar ou abrindo a porta da geladeira que todo mundo usa. O que importa é que, ao ver meu irmão instalado no meu ambiente, fui procurar a solidão em outro cômodo da casa, ignorando a organização urgente do meu espaço.
Passado o almoço e a formalidade das panelas e pratos limpos, fomos às compras. Distraídos com o agressivo mundo de cores e tentações que somente o consumismo proporciona, acabei chocado com o resultado final, aumentando minha angústia ainda mais. Até o caminho de casa mais dois pontos para o estresse. E aí vem o escapismo, a vontade de engolir de uma vez a caixa de remédios que envenena o armário da cozinha. Agora estou aqui, selando a fogo a raiva acumulada de uma linda tarde de domingo que, por razões de ordem biológica e metafísica, se tornou mais frustrante do que mil segundas-feiras.
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